São José no Pensamento e no Coração de São José Marello




SÃO JOSÉ NO PENSAMENTO E NO CORAÇÃO
DE SÃO JOSÉ MARELLO

Pe. Mario Passetti, osj


No dia 19 de março de 1988, Solenidade São José, o Pe. Mário Pasetti apresentou aos confrades do Setor de Roma a presente meditação sobre o pensamento de Dom José Marello sobre a devoção a São José. A análise resultante desta tem o privilégio de fazer descobrir os traços testa devoção desde os anos juvenis do Bem-aventurado José Marello, para apresentar-nos depois os seus ensinamentos como Fundador e como Bispo. Cada pensamento colocado no momento histórico da vida resulta assim mais compreensível e adquire um significado mais apropriado.

  O pensamento e o sentimento profundo do nosso Bem-aventurado Pai sobre São José nos são dados a conhecer através de suas cartas e dos seus escritos e ensinamentos. É ali que precisa buscá-los, tendo em conta do contexto do seu conjunto, como também dos diferentes tempos nos quais eles se manifestam.  É o que procuraremos fazer, sem contudo pretender exaurir um assunto que seria muito vasto; contentando-nos de encontrar as linhas mestras.
  O primeiro escrito no qual o Marello faz referência a São José, nos leva nos anos 1866 – 1867 quando ele estava no terceiro ano de Teologia.
  Trata-se de uma nota espiritual, escrita depois da leitura de Santa Margarida Maria Alacoque. “Nunc coepi: agora começo, meu Deus, meu Jesus, minha Mãe Maria, meu Protetor José, meu Anjo. Nunc coepi, eu vos escutarei sempre – Nunc coepi, eu lançarei fora o hábito da minha prevaricação – Nunc copei, eu me encaminharei para a vida do céu seguindo as inspirações que me fareis brilhar de cima”.  (Escritos pg. 19).
  Em todo o caminho, assim humanamente sincero, a plena confiança na ajuda do seu Protetor, com aquela de Jesus e de Maria, é bem clara; não somente, mas  aquela união de José, Jesus e Maria, vai se fortificando porque é expressão de uma visão plena e não redutiva do ministério salvífico, que inclui por vontade de Deus a presença de Maria e de José, seja na vida terrena na vida do Salvador, seja na vida da Igreja, Corpo Místico de Jesus Cristo; isto  vai compreendido também no uso das iniciais J.M.J (Jesus, Maria, José), que aparece no cabeçalho de boa parte de suas cartas.
  Os mesmos conceitos e sentimentos da nota espiritual,  à qual nos referimos, reencontramos em uma carta de 12 de janeiro de 1868 - N.24 – a Pe. Stefano Delaude.  O Marello já é sacerdote; pensa com o amigo numa pré-cruzada de renovação espiritual em preparação ao grande evento do Concílio Vaticano I, e assim se exprime: “Precisa organizar verdadeiramente uma cruzada mas sem os aparatos da formalidade e das classificações materiais de forças: basta um bom desejo a cada instante elevado até Deus e traduzido em ação com a obediência prática à sua Vontade. Portanto, meu caro Stefano, quando começaremos  verdadeiramente? In nomine Domine Nostri Jesu Christi, agora mesmo. Oh! Senhor, tu que vês e legislas no profundo do coração abençoe o nosso propósito e nos ajudes com a tua graça de mantê-lo até o fim dos nossos dias. E Maria? Sem ela Mãe amantíssima, como teremos forças para começar, pobres meninos por caminhos inexplorados?... Jesus, Maria, José, Anjos e Santos nossos protetores, nós queremos ir convosco, qual a estrada mais segura?”
  Dois meses depois desta carta por ocasião dos votos de São José ao onônimo caríssimo Pe. José Riccio, sai da mente e do coração do Marello esta estupenda oração: “Óh glorioso Patriarca São José, não vos esqueçais de nós, que vamos arrastando esta mísera carne em dura terra de exílio. Vós, que depois da Virgem bendita, fostes o primeiro a  abraçar o Redentor Jesus, sede  para nós o  modelo em nosso ministério (3) que, como  o vosso, é ministério de relacionamento íntimo com  o Verbo  Divino, ensinai-nos,  assisti-nos e tornai-nos dignos membros da Sagrada Família (Carta 35).

Aqui se entrelaçam admiravelmente, como é fácil relevar, a grandeza da missão de São José, o seu poder de intercessão e a sua extraordinária exemplaridade, que interessa muito bem aos mesmos ministros do Senhor.
Mas venhamos ao Concílio Vaticano I acima mencionado, ao qual o Marello, na qualidade do seu Bispo, Carlos Savio, teve a graça de participar por nove meses, até quando o Concílio foi estendido “sine die”. O quanto intensamente ele tenha vivido naqueles meses de excepcional vida eclesial podemos colher na carta cheia de entusiasmo, escrita ao Pe. Stefano Delaude no dia 18 de julho de 1870, dia memorável proclamação da Infabilidade Pontifícia; mas não menos vibrante e cheio de satisfação e de alegria é um outro escrito dirigido a Pe. José Riccio no dias 17 de março de 1870, onde fala das petições feitas ao Concílio por 38 Cardeais, 153 Bispos, 43 superiores Gerais, para proclamação de São José como Patrono da Igreja Universal. A carta, nas partes que nos interessam soa assim: “Caríssimo irmão em São José na ante-vigília do nosso Santo Patrono e nos momentos em que a devoção ao Chefe da Sagrada Família está para alcançar o mais alto desenvolvimento, graças a petição feita pela cristandade aos padres do Vaticano Concílio, eu não posso deixar de escrever duas palavras àquele que entre tantos confrades onônimos é ser certamente o mais próximo ao meu coração. Rezemos todos os dois de acordo no dia do nosso grande Patriarca, a fim de que começando a exaltá-lo nos nossos corações, nos tornemos dignos de vê-lo exaltado proximamente por toda a cristandade com o título que lhe está sendo preparado de Patrono da Igreja Universal. Viva São José com seus devotos”. (Carta 64)
            A exaltação de São José desejada pelo Marello, aconteceu como todos sabem no dia 08 de dezembro de 1870, solenidade da Imaculada. A luz e o impulso operativo que a devoção do nosso Venerável Pai, para com São José, trouxe destes acontecimentos  foram verdadeiramente grandes, assinalando indelevelmente todo o resto de sua vida sacerdotal e episcopal.
            Passam apenas dois anos da celebração do Concílio e vemos o Marello tornar-se promotor principal da fundação de uma Companhia de São José, promotora dos interesses de Jesus. O esboço desta Companhia está numa carta ao Cônego João Cerruti do dia 25 de outubro de 1862 (Carta 76). Releiamos ao menos em parte, aquele texto tendo também presente que o escritor estava apenas nos seus 28 anos de idade.  “Essa (a Companhia) tem uma espécie de direito nato para residir na casa e oficiar na Igreja de Jesus. Nenhum vínculo especial entre os companheiros de São José, apenas o vínculo espiritual da caridade. Cada um toma as próprias inspirações de seu modelo São José, que foi na terra o primeiro a cuidar dos interesses de Jesus; ele no-lo guardou criança, protegeu o menino, fez-lhe o papel de pai nos primeiros trinta anos de sua vida na terra... todos podem fazer parte da Companhia: bastando para isso unir o propósito secreto de ter com essa a comunhão dos interesses. Quem se dispõe a participar da Companhia deve porém fazer diante do Senhor a sincera promessa de empenhar-se na medida de suas forças na promoção dos interesses de Jesus... (...) Não existe lugar nem tempo em que não se possa fazer qualquer coisa. Cada palavra, cada passo, cada desejo... pode ser a matéria bruta dos interesses de Jesus. Em uma espantosa variedade de maneiras o Reino de Deus é demolido; procuremos fazer em todos os lugares o nosso trabalho de restauração com a ajuda do Céu”. (Carta 76) Segue outras indicações de comportamento (simplicidade, caridade, obediência), e esta oração:  “Sancte Joseph Custus Jesus et Ptotectot noster accipe nos comites tuos in ministeriis quae in terris persolvege meruisti: Oh! São José, Guarda de Jesus e nosso Protetor acolhe-nos como teus companheiros nos ministérios que merecestes realizar na terra”.
             Não existe ninguém que não veja a densidade e a beleza deste texto e a novidade da proposta que mereceria uma boa e ampla reflexão observemos somente que a exemplaridade de São José volta para propor-se também como modelo de ação para todos. Um santo, portanto José, na visão do Marello, que deu sim a Jesus o coração, mas também a êxtase da oração, as mãos, o suor, e o serviço de toda uma vida. Não vos parece que esteja já aqui, como “in nuce” quase toda doutrina hodierna da Igreja sobre os ministérios.
            Mas vamos para frente no tempo. Depois daquele 1872, uma inspiração, já presente na alma do Marello, mas não bem definida, torna-se premente e toma aos poucos contornos distintos na sua mente e bate no seu coração. Duas cartas de 1867 ao Pe. César Rolla (Carta 94 e 95) nos fazem conhecer o quanto de novo e de interessante se maturou ainda nele a respeito de seu caro Santo. Ele vê agora claramente em São José um modelo, aliás o mais perfeito modelo juntamente com Maria, da vida religiosa como seguimento de perto ao Cristo com observância dos conselhos evangélicos; ele sente que o Senhor quer que na Igreja haja quem dedique assim ao seu serviço oferecendo-se totalmente a ele, na imitação de São José. Escreve na Carta 95: “A quem desejar seguir de perto o divino Mestre com a obser­vância dos Conselhos Evangélicos, está aberta a Ca­sa de São José, na qual, retirando-se com o propósito de permanecer escondido e silenciosamente operoso, na imitação deste grande Modelo de vida pobre e obscura, terá condições de tornar-se um verdadeiro discípulo de Jesus Cristo.
            O Irmão de São José não é um Religioso Professo, mas um simples Oblato, que se oferece continuamen­te a Deus para alcançar a perfeição, desapegado de todo prazer terreno do corpo e do espírito.
As obrigações da Companhia de São José são fixa­das pelas palavras do próprio N.S.J.C., que disse: “Quem não se desapegar de tudo o que possui... quem não renunciar ao amor dos parentes e até mesmo de si próprio não pode ser meu discípulo”; palavras que encerram os três pontos essenciais da vida de perfeição: pobreza, ou seja, renúncia aos bens da terra; castidade, ou seja, renúncia aos prazeres; obediência; ou seja, renúncia à própria vontade. São Bento, Patriarca da vida religiosa no Ocidente, ex­pressou essa tríplice renúncia com admirável precisão e concisão na seguinte Regra: O Irmão não deve possuir nada de próprio, nada de nada; não lhe sendo absolutamente lícito guardar em seu arbítrio nem o próprio corpo nem a própria vontade. Regra de São Bento, Capitulo 33.
Podemos fazer um comentário de um trecho não tomado dos escritos de “Breve Memórias” de Pe. João Batista Cortona (Pe. B. Pozzi e Pe. G.Viola) mas presente no original manuscrito por ele. Diz Pe. Cortona: “este era o pensamento que freqüentemente o Padre repetia, pois se como na Igreja existia Congregações Religiosas que tinham como finalidade particular a meditação das dores de Maria Santíssima, como os Servos de Maria, e além disso de meditar a Paixão de Jesus Cristo, como os Passionistas, assim os Oblatos de São José deviam esforçar-se de imitar, o mais próximo que pudessem a vida escondida de São José. “Fortunados  aqueles dizia, que compreendem o valor da vida escondida; esses  darão certamente glória a Deus, porque uma alma desejosa de vida escondida, ignorada pelo mundo, toda voltada a servir a Deus e a buscar somente Ele, lhe dará certamente a máxima glória. De fato, Jesus Cristo, sabedoria eterna vindo sobre esta terra para glorificar o seu eterno e Divino Pai, passou quase toda a sua vida no escondimento, dando à vida pública somente aquilo que era necessário para prorrogar a sua Doutrina e fundar a Igreja. Em segundo lugar, considerava nossa debilidade e aquele desejo inato que temos de aparecer; a vida escondida é o meio mais seguro para chegar à perfeita retidão de intenção, com divisão indispensável para operar com mérito. A humildade atrai a benção de Deus sobre nós e sobre as  nossas obras, é aquela que edifica o nosso próximo já que a modéstia agrada a todos, também aos maus”. Assim Pe. Cortona, depois de ter acenado a outras considerações do Fundador, concluiu: “Oh! Como se comovia aquela grande alma tão devota de São José falando da vida do Santo! E se como procurava de fazer penetrar nos nossos corações aquele amor a São José do qual era tão acesso!”
 Acrescenta-se ainda ao escrito de Pe. Cortona aquilo que encontramos nas Regras da Congregação de São José de 1892, as quais no Capítulo I dizem: “A Congregação de São José se denomina com o nome de tal Santo, porque o escolheu qual modelo do seu viver, porque o tomou como Patrono especial. Entrando um a fazer parte da Congregação de São José, deverá renunciar ao mundo e a si mesmo, para consagrar-se inteiramente a Deus com a observância dos Santos Mandamentos com a prática dos Conselhos Evangélicos; para imitar assim São José que foi o primeiro modelo de vida religiosa, tendo tido ele continuamente debaixo de seus olhos aquele divino exemplar, que o Eterno Pai, por sua misericórdia quis enviar ao mundo para que mostrasse o caminho do Céu”. (Escritos pg 133).
A este ponto creio que já se delineiam diante de nossos olhos aquelas linhas mestres, aquelas diretrizes de pensamento e de sentimentos do nosso Pai Fundador a respeito de São José, as quais foram acenadas no início dessa nossa pesquisa. Podemos individuar três:
1.    Deve-se reconhecer em São José, como vontade de Deus, uma grandeza única, que nos deve levar a venerá-lo acima de todos os  santos, sem separá-lo jamais  da glória de Jesus e de Maria.
2.    Ele é o Justo por excelência, modelo insuperável de todas as virtudes, para todos os estados de vida, especialmente para aquele religioso, seja contemplativo que ativo.
3.    São José pode tudo junto de Jesus e Maria, nada lhe é negado. A sua extraordinária força de intercessão deve nos encher de plena confiança nele, em cada acontecimento da vida.

Antes de terminar, seja me permitido de acrescentar, para confirmar o quanto ulteriormente foi dito até aqui, um outro trecho dos escritos do Fundador aos nossos primeiros padres e irmãos, ou a outras pessoas.

·         Ao Irmão Felipe Navone (06 de março de 1893: o Irmão estava em dificuldade nos estudos): “Se, às semelhanças do grande Patriarca São José você tivesse que servir Jesus nos trabalhos modestos e inferiores ao de São Pedro pensaria que o humilde Guarda de Jesus está mais alto no Céu que o grande apóstolo”. (Carta 248).

·         Ao Pe. Cortona (20 de março de 1891) na ocasião da Solenidade de São José: “Filius accrescens Joseph  e os filhos de São José devem crescer também eles pelo menos no culto aos seu Santo Patriarca” (Carta 220).

·         A Bice Graglia ( 22 de março de 1889: Direção Espiritual).  “São José não desejava nada, não queria nada a não ser agradar a Deus; por isso era sempre inperturbável, mesmo nas contrariedades. Contemplemos esse modelo e aprendamos a nos manter calmos e serenos em todas as circunstâncias da vida”.(Escrito  pg 228)

·         Ao Pe. Cortona (07 de março de 1891: a respeito do estudo e do trabalho dos irmãos) “As fatigas intelectuais e aquelas manuais sejam contemperadas como dois meios que conduzem a um único fim: o serviço de Deus na imitação de São José (Carta 207).

·         Ao Pe. Cortona (08 de março de 1891: em razão de uma decisão a ser tomada na economia) “Digamos ao nosso grande Patriarca: Eis nos todo para ti, e tu sejas todo para nós, indica-nos oh José o caminho, sustenta-nos a cada passo, conduz-nos para onde  a Divina Providência quer que cheguemos. Seja comprido ou curto, bom ou mal  o caminho, enxergue ou não a meta com a vista humana, devagar ou depressa, contigo, oh José, estamos certos de que sempre caminharemos bem”. (Carta 208).

·         A Irmã Albertina Fasolis ( 20 de maio de 1894: Direção Espiritual) “ Se São José não concedesse graças não seria mais São José” (Escrito pg 173).

Conclusão: estamos diante de uma herança preciosíssima, diante daquele patrimônio espiritual da Congregação, que a Igreja hoje não se cansa de aconselhar a todos os religiosos. Deus nos livre, portanto de dissipá-lo, esquecendo-o. Torne-se  em vez para cada um de nós substância do nosso pensamento, alegria do nosso coração, empenho de toda a vida como foi para o nosso Pai Fundador.


Artigo publicado em  Marellianum -  nº 8  ano  1993
Tradução Pe. José Antonio Bertolin, OSJ